A _ cor _ dar , é preciso !


domingo, fevereiro 28, 2010

sábado, fevereiro 27, 2010

Côr de promessas .



Um homem ,
perdera a sua ferramenta de trabalho e , compungido , dirigiu-se ao Divino para lhe suplicar ...
_ Ajuda-me a encontrar a minha ferramenta de trabalho . Se conseguires que a encontre , prometo que entregarei três moedas de ouro aos pobres _
No dia seguinte , encontrou a ferramenta .
Então , dirigiu-se de novo ao Divino para lhe rogar ...
_ Poderoso Senhor , já que conseguiste que eu encontrasse a minha ferramenta de trabalho , faz com que encontre três moedas de ouro _ .



Ramon Calle _ Os melhores contos espirituais do Oriente _

Como há algo de actual neste conto ... ...
Na sua forma , imatura , de promessas e embustes !

segunda-feira, fevereiro 22, 2010

Côr de implosiva .



Mentiram-me. Mentiram-me ontem
e hoje mentem novamente. Mentem
de corpo e alma, completamente.
E mentem de maneira tão pungente
que acho que mentem sinceramente
Mentem, sobretudo, impune/mente.
Não mentem tristes. Alegremente
mentem. Mentem tão nacional/mente
que acham que mentindo história afora
vão enganar a morte eterna/mente.
Mentem.Mentem e calam. Mas suas frases
falam. E desfilam de tal modo nuas
que mesmo um cego pode ver
a verdade em trapos pelas ruas.
Sei que a verdade é difícil
e para alguns é cara e escura.
Mas não se chega à verdade
pela mentira , nem à democracia
pela ditadura .

Evidente/mente a crer
nos que me mentem
uma flor nasceu em Hiroshima
e
em Auschwitz havia um circo permanente .

Mentem. Mentem caricatural-
mente.
Mentem como a careca
mente ao pente,
mentem como a dentadura
mente ao dente,
mentem como a carroça
à besta em frente,
mentem como a doença
ao doente,
mentem clara/mente
como o espelho transparente.
Mentem deslavadamente,
como nenhuma lavadeira mente
ao ver a nódoa sobre o linho. Mentem
com a cara limpa e nas mãos
o sangue quente. Mentem
ardente/mente como um doente
em seus instantes de febre.Mentem
fabulosa/mente como o caçador que quer passar
gato por lebre.E nessa trilha de mentiras
a caça é que caça o caçador
com a armadilha.
E assim cada qual
mente industrial?mente,
mente partidária?mente,
mente incivil?mente,
mente tropical?mente,
mente incontinente?mente,
mente hereditária?mente,
mente, mente, mente.
E de tanto mentir tão brava/mente
constroem um país
de mentira
diária/mente.

Mentem no passado. E no presente
passam a mentira a limpo. E no futuro
mentem novamente.
Mentem fazendo o sol girar
em torno à terra medieval/mente.
Por isto, desta vez, não é Galileu
quem mente.
mas o tribunal que o julga
herege/mente.
( ... ... )
Tanta mentira assim industriada
me faz partir para o deserto
penitente/mente, ou me exilar
com Mozart musical/mente em harpas
e oboés, como um solista vegetal
que absorve a vida indiferente.
Penso nos animais que nunca mentem.
mesmo se têm um caçador à sua frente.
Penso nos pássaros
cuja verdade do canto nos toca
matinalmente.
Penso nas flores
cuja verdade das cores escorre no mel
silvestremente.
Penso no sol que morre
diariamente
jorrando luz, embora
tenha a noite pela frente.

Página branca onde escrevo. Único espaço
de verdade que me resta. Onde transcrevo
o arroubo, a esperança, e onde tarde
ou cedo deposito meu espanto e medo.
Para tanta mentira só mesmo um poema
explosivo-conotativo
onde o advérbio e o adjetivo não mentem
ao substantivo
e a rima rebenta a frase
numa explosão da verdade.
E a mentira repulsiva
se não explode pra fora
pra dentro explode
implosiva!


Afonso Romano de Sant'Ana .

domingo, fevereiro 21, 2010

Côr de ... lágrimas .



Pelas afrontas infligidas à Mãe Natureza
e
pelos que sofrem ,
[ alguns injustamente ] , as suas retaliações
!

sábado, fevereiro 20, 2010

Côr de a construção .



Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido

Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima

Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado

E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego

Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho seu como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado

Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego.

Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música

E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público

Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado

Morreu na contramão atrapalhando o sábado


Por esse pão pra comer, por esse chão prá dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir,
Deus lhe pague.

Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair
Deus lhe pague

Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir
Deus lhe pague
!

Francisco Buarque de Holanda

quarta-feira, fevereiro 17, 2010

Côr de nome de trigo e silêncio .



*
Tinhas um nome de trigo e de silêncio .
E no círculo da tua íris a melancolia
de um verde leve e de um lilás suave.
O teu sorriso cintilava como o oiro da penumbra .
O vento da sombra despenteara-te os cabelos
e o negro ramalhete de uma madeixa esguia
pendia sobre a tua fronte pálida e indecisa .

Aproximei-me do teu rosto como uma vogal branca
e acariciei-o como se acaricia uma nascente de linho
ou uma pequena estrela limpa uma andorinha branca ,
e com os meus dedos soletrei-lhe todas as minúcias mágicas .

Pronunciou então o meu nome num murmúrio de seda ou como um óleo de lua .
O meu sangue deslizou sob uma chuva de pólen para o lábio de uma praia
entre a primavera e o outono da ternura .

Minha pequena estrela que julgara perdida .
Erguia-se da água com os ombros esguios ,
e da fonte dos ventos mais suaves
como uma ânfora de linfa ou um ramo de oiro pálido .

António Ramos Rosa

segunda-feira, fevereiro 15, 2010

Côr de uma só asa .




Somos Anjos de uma só asa .
Para pudermos voar ,
precisamos de abraçar alguém
que tenha uma só asa , também !

domingo, fevereiro 14, 2010

sábado, fevereiro 13, 2010

Côr de ... não sabem viver .


*
Gosto dos que não sabem viver,
dos que se esquecem de comer a sopa
[
Allez-vous bientôt manger votre soupe,
s... b... de marchand de nuages
?]

e embarcam na primeira nuvem
para um reino sem pressa e sem dever.

Gosto dos que sonham enquanto o leite sobe,
transborda e escorre, já rio no chão,
e gosto de quem lhes segue o sonho
e lhes margina o rio com árvores de papel.

Gosto de Ofélia ao sabor da corrente.
Contigo é que me entendo,
piquena que te matas por amor
a cada novo e infeliz amor
e um dia morres mesmo
em »grande parva, que ele há tanto homem
!
»

[Dá Veloso-o-Frecheiro um grande grito?. . .]


Gosto do Napoleão-dos-Manicómios,
da Julieta-das-Trapeiras,
do Tenório-dos-Bairros
que passa fomeca mas não perde proa e parlapié...

Passarinheiros, também gosto de vocês
!

Será isso viver, vender canários
que mais parecem sabonetes de limão,
vender fuliginosos passarocos implumes
?


Não é viver.
É arte, lazeira, briol, poesia pura
!


Não faço
[quem é parvo?]
a apologia do mendigo;
não me bandeio
[que eu já vi esse filme...]

com gerações perdidas.

Mas senta aqui, mendigo...
vamos fazer um esparguete dos teus atacadores
e comê-lo como as pessoas educadas,
que não levantam o esparguete acima da cabeça
nem o chupam como você , seu irrecuperável
!


E tu, derradeira geração perdida,
confia-me os teus sonhos de pureza
e cai de borco, que eu chamo-te ao meio-dia...

Por que não põem cifrões em vez de cruzes
nos túmulos desses rapazes desembarcados p'ra morrer
?


Gosto deles assim, tão sem futuro,
enquanto se anunciam boas perspectivas
para o franco frrrrançais
e os politichiens si habiles, si rusés,
evitam mesmo a tempo a cornada fatal
!


Les portugueux...
não pensam noutra coisa
senão no arame, nos carcanhóis, na estilha,
nos pintores, nas aflitas,
no tojé, na grana, no tempero,
nos marcolinos, nas fanfas, no balúrdio e
... sont toujours gueux,
mas gosto deles só porque não querem
apanhar as nozes...

Dize tu ... - Já começou, porém, a racionalização do trabalho
?
Direi eu ... Todavia , o manguito será por muito tempo o mais económico dos gestos !

Saber viver é vender a alma ao diabo,
a um diabo humanal, sem qualquer transcendência,
a
um diabo que não espreita a alma, mas o furo,
a um satanazim que se dá por contente
de te levar a ti , de escarnecer de mim...
!




Alexandre O´Neill

sexta-feira, fevereiro 12, 2010

Côr de ôôôôi fia .



Dói-me a cabeça aos trinta e nove anos.
Não é hábito.

É rarissimamente que ela dói.
Ninguém tem culpa.

Meu pai , minha mãe descansaram seus fardos,
não existe mais o modo
de eles terem seus olhos sobre mim.
Mãe, ô mãe, ô pai, meu pai. Onde estão escondidos
?

É dentro de mim que eles estão.
Não fiz mausoléu pra eles, pus os dois no chão.
Nasceu lá, porque quis, um pé de saudade roxa,
que abunda nos cemitérios.
Quem plantou foi o vento, a água da chuva.
Quem vai matar é o sol.
Passou finados não fui lá , aniversário também não.
Pra quê ,
se
pra chorar qualquer lugar me cabe?
É de tanto lembrá-los que eu não vou.
Ôôôô pai
!

Ôôôô mãe
!

Dentro de mim eles respondem

tenazes e duros ,
porque o zelo do espírito é sem meiguices ...
Ôôôôi fia
!


Adélia Prado



É sabido, acontece com todos. Em dado momento , esbarramos com algo escrito como se fosse para nós ou por nós .
Será que o pássaro da alma , nos seus voos , tem a ver ... ?

É isso filhona .
Obrigada Mãezona !

terça-feira, fevereiro 09, 2010

Côr de ... com Maiakóvski .




Assim como a criança
humildemente afaga
a imagem do herói ,
assim me aproximo de ti, Maiakósvki.
Não importa o que me possa acontecer
por andar ombro a ombro
com um poeta soviético.
Lendo teus versos,
aprendi a ter coragem.

Tu sabes ,
conheces melhor do que eu
a velha história.
_Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite , já não se escondem ...
pisam as flores ,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia ,
o mais frágil deles
entra sozinho na nossa casa ,
rouba-nos a luz ,

e
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer
nada._

Nos dias que correm
a ninguém é dado
repousar a cabeça
alheia ao terror.
Os humildes baixam a cerviz ...
e nós , que não temos pacto algum
com os senhores do mundo,
por temor nos calamos.
No silêncio de meu quarto
a ousadia me afogueia as faces
e eu fantasio um levante .
Mas amanhã,
diante do juiz,
talvez meus lábios
calem a verdade
como um foco de germes
capaz de me destruir.

Olho ao redor
e o que vejo
e acabo por repetir
são mentiras.
Mal sabe a criança dizer mãe
e a propaganda lhe destrói a consciência.
A mim, quase me arrastam
pela gola do paletó
à porta do templo
e me pedem que aguarde
até que a democracia
se digne aparecer no balcão.
Mas eu sei,
porque não estou amedrontado
a ponto de cegar, que ela tem uma espada
a lhe espetar as costelas
e o riso que nos mostra
é uma tênue cortina
lançada sobre os arsenais.

Vamos ao campo
e não os vemos ao nosso lado,
no plantio.
Mas no tempo da colheita
lá estão
e acabam por nos roubar
até o último grão de trigo.
Dizem-nos que de nós emana o poder
mas sempre o temos contra nós.
Dizem-nos que é preciso
defender nossos lares ,
mas se nos rebelamos contra a opressão
é sobre nós que marcham os soldados.

E por temor eu me calo.
Por temor, aceito a condição
de falso democrata
e rotulo meus gestos
com a palavra liberdade,
procurando , num sorriso,
esconder minha dor
diante de meus superiores.
Mas dentro de mim,
com a potência de um milhão de vozes ,
o coração grita ...


MENTIRA!



EDUARDO ALVES DA COSTA

segunda-feira, fevereiro 08, 2010

Côr de Sacra Natura .



Oh Zeus pai nosso ,
tu libertarias a humanidade
dos males numerosos
que a acabrunham ,
se a todos mostrasses o Génio
de que são providos !

Então tu toma coragem ,
pois já sabes que divina
é a raça humana
e que a sacra Natura
abertamente lhe revela
as coisas todas .

Pitágoras _ Versos de Ouro _
_ Séc . VI a. C . _

domingo, fevereiro 07, 2010

sábado, fevereiro 06, 2010

Côr de armadura .



Tenho andado à tua procura _ disse ao mago _ Há meses que ando perdido_
_ Toda a tua vida _ corrigiu Merlim .
/
O cavaleiro estava demasiado cansado ... e adormeceu .
Quando despertou , viu Merlim e os animais , todos em seu redor. Tentou sentar-se , mas estava muito fraco. Merlim estendeu - lhe uma taça de prata com um liquido de uma estranha cor .
_ Bebe isto _ ordenou _
_ O que é isto ? _ inquiriu o cavaleiro , mirando a taça com desconfiança .
_ Tens tanto receio _ constatou Merlim _
Claro ! Foi por essa razão que começaste a usar a armadura .
_ Está bem , eu bebo . Entorne-o pela minha viseira _
_ Nem pensar _ exclamou Merlim _ É precioso demais para ser desperdiçado.
Arrancou uma cana fina , pôs uma extremidade na taça e enfiou a outra num dos orificios da viseira do cavaleiro
Os primeiros golos pareceram amargos , os seguintes mais agradáveis e os ultimos tragos bastante deliciosos . Grato devolveu a taça a Merlim .
_ Devias vender esta coisa no mercado .Ficarias rico .
Merlim sorriu apenas .
_ O que é ? _ perguntou o cavaleiro .
_ Vida _
_ Vida ? _
Sim _ afirmou o mago . _ Não pareceu amargo no princípio , e depois , à medida que que lhe ias tomando o paladar , não se tornou agradável ?
O cavaleiro acenou com a cabeça . _ Sim , e os últimos foram absolutamente deliciosos.
_ Foi quando começaste a aceitar aquilo que bebias .
/
... ... ...
/
Quase morri « das lágrimas que não chorei » , pensava.
As lágrimas deslizavam pelo rosto, através da barba , até ao peito . E porque provinham do coração , eram extraordinariamente quentes , e depressa derreteram o que restava da armadura .


Robert Fisher _ O cavaleiro da armadura enferrujada .
[ Com muitíssimos cortes ]


Obrigada pelo presente , Amigo sem armadura .

terça-feira, fevereiro 02, 2010

Côr de fábula de fábula .



Era uma vez
Uma fábula famosa,
Alimentícia
E moralizadora,
Que, em verso e prosa,
Toda gente
Inteligente,
Prudente
E sabedora
Repetia
Aos filhos,
Aos netos
E aos bisnetos.
À base duns insectos,
De que não vale a pena fixar o nome,
A fábula garantia
Que quem cantava
Morria
De fome.

E realmente...
Simplesmente,
Enquanto a fábula contava,
Um demônio secreto segredava
Ao ouvido secreto
De cada criatura
Que quem não cantava
Morria de fartura.


Miguel Torga

segunda-feira, fevereiro 01, 2010