A _ cor _ dar , é preciso !


terça-feira, novembro 30, 2010

Côr de nevoeiro . . .



Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer ...

Brilho sem luz e sem arder ,
Como o que o fogo-fatuo encerra.

Ninguem sabe que coisa quere.
Ninguem conhece que alma tem,
Nem o que é mal nem o que é bem.
_ Que ancia distante perto chora
? _

Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal , hoje és nevoeiro ...

É a Hora
!



*
Fernando Pessoa _ A Mensagem _
Olga Domanova

domingo, novembro 28, 2010

Côr de Ver .


*
Assim como há muitos que olham para cegar , que são os que olham sem tento , assim há muitos que vêem sem olhar porque vêem sem atenção . Não basta ver para ver , é necessário olhar para o que se vê . Não vemos as cousas que vemos , porque não olhamos para elas .Vêmo -las sem advertência e atenção , e a mesma desatenção é a cegueira da vista .
Divertem - nos a atenção os pensamentos ; suspendem - nos a tenção os cuidados ; prendem - nos a atenção os afectos ; e por isso , vendo a vaidade do mundo , imos após ela como se fora muito sólida . Vendo o engano da esperança , confiamos nela como se fora muito certa . Vendo a fragilidade da vida , fundamentamos sobre ela castelos como se fora muito firme . Vendo a inconstância da fortuna , seguimos suas promessas como se foram muito muito seguras . Vendo a mentira de todas as cousas humanas , cremos nelas como se foram muito verdadeiras .

*


Padre António Vieira [ sermões _ 35 _ ]
Lisa Clague

quarta-feira, novembro 24, 2010

sábado, novembro 20, 2010

Côr de fome de amor



Em todas as esquinas da cidade
nas paredes dos bares à porta dos edifícios públicos nas janelas dos autocarros
mesmo naquele muro arruinado por entre anúncios de aparelhos de rádio e detergentes
na vitrine da pequena loja onde não entra ninguém
no átrio da estação de caminhos de ferro que foi o lar da nossa esperança de fuga
um cartaz denuncia o nosso amor

Em letras enormes do tamanho
do medo da solidão da angústia
um cartaz denuncia que um homem e uma mulher
se encontraram num bar de hotel
numa tarde de chuva
entre zunidos de conversa
e inventaram o amor com caracter de urgência
deixando cair dos ombros o fardo incómodo da monotonia quotidiana .

Um homem e uma mulher que tinham olhos e coração e fome de ternura
e

souberam entender-se sem palavras inúteis .
Apenas o silêncio A descoberta A estranheza
de um sorriso natural e inesperado .

Não saíram de mãos dadas para a humidade diurna
Despediram-se e cada um tomou um rumo diferente
embora subterraneamente unidos pela invenção conjunta
de um amor subitamente imperativo .

Um homem e uma mulher um cartaz denuncia
colado em todas as esquinas da cidade .
A rádio já falou A tv anuncia
iminente a captura . A policia de costumes avisada
procura os dois amantes nos becos e nas avenidas
Onde houver uma flor rubra e essencial
é possível que se escondam tremendo a cada batida na porta fechada para o mundo
É preciso encontrá-los antes que seja tarde .
Antes que o exemplo frutifique .

Antes que a invenção do amor se processe em cadeia .

Há pesadas sanções para os que auxiliarem os fugitivos .
Chamem as tropas aquarteladas na província
Convoquem os reservistas os bombeiros os elementos da defesa passiva
Todos decrete-se a lei marcial com todas as consequências
O perigo justifica-o
.
Um homem e uma mulher
conheceram-se amaram-se perderam-se no labirinto da cidade .

É indispensável encontrá-los dominá-los convencê-los
antes que seja tarde
e a memória da infância nos jardins escondidos
acorde a tolerância no coração das pessoas

Fechem as escolas .

Sobretudo protejam as crianças da contaminação .
Uma agência comunica que algures ao sul do rio
um menino pediu uma rosa vermelha
e chorou nervosamente porque lha recusaram .
Segundo o director da sua escola é um pequeno triste inexplicavelmente dado aos longos silêncios e aos choros sem razão
Aplicado no entanto respeitador da disciplina
Um caso típico de inadaptação congénita disseram os psicólogos .
Ainda bem que se revelou a tempo .Vai ser internado
e submetido a um tratamento especial de recuperação
Mas é possível que haja outros . É absolutamente vital
que o diagnóstico se faça no período primário da doença
E também que se evite o contágio com o homem e a mulher
de que fala no cartaz colado em todas as esquinas da cidade

Está em jogo o destino da civilização que construímos
o destino das máquinas das bombas de hidrogénio das normas de discriminação racial
o futuro da estrutura industrial de que nos orgulhamos
a verdade incontroversa das declarações políticas
/

É possível que cantem
mas defendam-se de entender a sua voz Alguém que os escutou
deixou cair as armas e mergulhou nas mãos o rosto banhado de lágrimas
E quando foi interrogado em Tribunal de Guerra
respondeu que a voz e as palavras o faziam feliz
lhe lembravam a infância Campos verdes floridos
Água simples correndo A brisa das montanhas .
Foi condenado à morte é evidente .É preciso evitar um mal maior
Mas caminhou cantando para o muro da execução
foi necessário amordaçá-lo e mesmo desprendia-se dele
um misterioso halo de uma felicidade incorrupta
/

Procurem a mulher o homem que num bar
de hotel se encontraram numa tarde de chuva
Se tanto for preciso estabeleçam barricadas
senhas salvo-condutos horas de recolher
censura prévia à Imprensa tribunais de excepção
Para bem da cidade do país da cultura
é preciso encontrar o casal fugitivo
que inventou o amor com carácter de urgência

Os jornais da manhã publicam a notícia
de que os viram passar de mãos dadas sorrindo
numa rua serena debruada de acácias
Um velho sem família a testemunha diz
ter sentido de súbito uma estranha paz interior
uma voz desprendendo um cheiro a primavera
o doce bafo quente da adolescência longínqua


*
Daniel Filipe _ A invenção do Amor _
Mel Odon

sábado, novembro 13, 2010

Côr de pequena oração


Quando
a nossa dor descansa ,
e as lágrimas nos olhos são mais frescas que o orvalho das flores ...
Ave - Maria
*
*
Cristovam Pavia
Dominique Telmon

domingo, novembro 07, 2010

Côr de musica que gosto

Por este rio acima
Deixando para trás
A côncava funda
Da casa do fumo
Cheguei perto do sonho
Flutuando nas águas
Dos rios dos céus
Escorre o gengibre e o mel
Sedas porcelanas
Pimenta e canela
Recebendo ofertas
De músicas suaves
Em nossas orelhas
leve como o ar
A terra a navegar
Meu bem como eu vou
Por este rio acima

Por este rio acima
Os barcos vão pintados
De muitas pinturas
Descrevem varandas
E os cabelos de Inês
Desenham memórias
Ao longo da água
Bosques enfeitiçados
Soutos laranjeiras
Campinas de trigo
Amores repartidos
Afagam as dores
Quando são sentidos
Monstros adormecidos
Na esfera do fogo
Como nasce a paz
Por este rio acima

Meu sonho
Quanto eu te quero
Eu nem sei
Eu nem sei
Fica um bocadinho mais
Que eu também
Que eu também
meu bem

Por este rio acima
isto que é de uns
Também é de outros
Não é mais nem menos
Nascidos foram todos
Do suor da fêmea
Do calor do macho
Aquilo que uns tratam
Não hão-de tratar
Outros de outra coisa
Pois o que vende o fresco
Não vende o salgado
Nem também o seco
Na terra em harmonia
Perfeita e suave
das margens do rio
Por este rio acima

Meu sonho
Quanto eu te quero
Eu nem sei
Eu nem sei
Fica um bocadinho mais
Que eu também
Que eu também
meu bem

Por este rio acima
Deixando para trás
A côncava funda
Da casa do fumo
Cheguei perto do sonho
Flutuando nas águas
Dos rios dos céus
Escorre o gengibre e o mel
Sedas porcelanas
Pimenta e canela
Recebendo ofertas
De músicas suaves
Em nossas orelhas
leve como o ar
A terra a navegar
Meu bem como eu vou
Por este rio acima


Fausto

sábado, novembro 06, 2010

Côr de imortalidade



















Muitas vezes ,
à beira de achar a receita da imortalidade ,
fui distraído pela presença pavorosa da morte .


Hector Faciolince_ Receitas de amor para mulheres tristes _
Laurie Lipton

terça-feira, novembro 02, 2010

segunda-feira, novembro 01, 2010

Côr de herança musical

Uma das musicas preferídas de meu Avô .
Mais tarde de
meu Pai e minha , neste momento .




Para o meu Pai , já que seria dia de seu aniversário , o presente que gostaria , por singelo .
Considerava crime cortar flores e não aplaudia homenagens póstumas .
_ Amem - me em vida _ dizia
.