Tinham as mãos amarradas, ou algemadas,
e
ainda assim , os dedos dançavam , voavam ,
desenhavam palavras .
Os presos estavam encapuzados , mas inclinando-se conseguiam ver alguma coisa , alguma coisinha , por baixo. E embora fosse proibido falar, eles conversavam com as mãos.
Pinio Ungerfeld ensinou me o alfabeto dos dedos , que aprendeu na prisão sem professor . . .
_ Alguns tinham caligrafia ruim , me disse. Outros tinham letra de artista _ .
A ditadura uruguaia queria que cada um fosse apenas
um , que cada um fosse ninguém . . .
nas cadeias e quartéis , e no país inteiro , a comunicação era delito.
Alguns presos passaram mais de dez anos enterrados em calabouços solitários do tamanho de um ataúde , sem escutar outras vozes além do ruído das grades ou dos passos das botas pelos corredores.
Fernández Huidobro e MaurícioRosencof , condenados
a essa solidão , salvaram-se porque conseguiram conversar , com batidinhas na parede.
Assim contavam sonhos e lembranças, amores e desamores , discutiam , se abraçavam ,
brigavam , compartilhavam certezas e belezas
e
também dúvidas e culpas e perguntas que não têm resposta.
Quando é verdadeira , quando nasce da necessidade de dizer ,
a voz humana não encontra quem a detenha.
Se lhe negam a boca , ela fala pelas mãos .
Eduardo Galeano _ O livro dos abraços _
imagem _ net _
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