A _ cor _ dar , é preciso !


terça-feira, julho 13, 2010

Côr de retrato .



Era uma vez ...
uma fonte à beira da estrada.
Os pardais das árvores vizinhas tinham ali o seu ponto de encontro.
Matavam a sede, tomavam banho, chilreavam uns com os outros.
De semana a semana, vinha um homem, sempre de automóvel, buscar água à fonte. Enchia uma quantidade de garrafões de plástico e , depois , abalava.
Nessas alturas , a pardalada fugia para o poiso das árvores e ficava a observar.
_ O que é que ele vai fazer com tanta água _
?
intrigava-se um pardalito novo.
_ Deve ir regar as couves _ sugeria um pardal.
_ Para regar as couves é pouca _ replicava uma velha pardoca , muito conhecedora da vida.
_ Então é para ele beber _ propunha outro pardal.
_ Para ele beber é muita _ replicava a velha pardoca.
_ Para o que será
?
_ perguntava o pardalito, sem que ninguém soubesse responder -
lhe.
Decidiu investigar. Voou atrás do automóvel, mas como ainda tinha as asas com pouca força e a estrada era às curvas e contra-curvas, perdeu-lhe o rasto. E perdeu-se.
Esvoaçou ao calhas, até descer sobre um telheiro, junto à estrada. No telheiro havia melões à venda e cebolas e batatas e garrafões de vinho.
Alto lá !
E também havia garrafões de água , tal e qual os que o homem do automóvel enchia, na fonte dos pardais.
Se o pardal soubesse ler, leria no rótulo dos garrafões ...
“Água da Fonte da Saúde _ Graças a ela, os novos crescem e os velhos não encolhem _ ".
Aos saltinhos, diante dos garrafões , o pardalito admirava a fotografia do rótulo. Lá estava a fonte , centro da sua vida , e uns passarinhos a beber água no rebordo do tanque. Vendo bem , aquele mais pequeno, à direita, podia ser ele, o pardalito aventureiro.
Muito orgulhoso da sua descoberta, o pardal voou muito alto, tão alto que , lá de cima, viu o telheiro dos garrafões, a estrada às curvas e a fonte da Saúde ou dos pardais, donde ele viera.
Disparou em direcção ao ponto de partida e muito excitado piou para os companheiros:
_ Já sei o segredo dos garrafões. O homem anda a vender o nosso retrato mais o retrato da nossa fonte.
_ E a água para que serve? — perguntou um companheiro.
_ Para segurar o nosso retrato — respondeu , prontamente, o pardalito.


António Torrado


Qualquer semelhança com atitudes e pensamentos humanos , é pura coincidência .

2 comentários:

Lilá(s) disse...

Gosto muito de ler na net, "uma história por dia" do António Torrado. Esta é linda.
Bjs

AC disse...

Este texto ficaria em lugar de destaque nas Fábulas de La Fontaine.

Beijo